abril 13, 2006

Avalanche!

Yunnan, Abril 2006


Faz hoje uma semana, andava eu por terras da China, província de Yunnan, com seis amigos quando, após mais de 6 horas de caminhada montanha acima, montanha abaixo (uns a pé, outros de burro), fomos, no regresso pela mesma estrada que fizéramos dois dias antes, de novo confrontados com derrocadas de pedras.
Se à ida a situação já tinha sido emocionante - pelo seguro, e para facilitar a vida ao "Dentes" condutor do nosso autocarro, atravessámos a pé por cima dos imensos calhaus acumulados e ficámos na expectativa a ver as tentativas para fazer passar o veículo que, às tantas, estava de tal forma torto que voltou para trás e foi necessário remover pedras e tornar o solo menos irregular... uma queda pelo precipício significaria morte certa - no regresso estava assustador!
Havia carros, autocarros, camiões TIR parados sem passar há mais de dia e meio; enquanto alguns ficávamos no autocarro, outros foram para uma zona mais próxima da derrocada ver o que se passava; ao regressarem as notícias eram desanimadoras: impossível transitar porque tentá-lo era brincar com a sorte... A alternativa era fazer mais de 600 quilómetros por estrada de montanha para chegar ao hotel que estava apenas a cerca de 10...
Ouvir isto, quando se está com os pés encharcados há horas graças à caminhada pela neve e quando a temperatura ronda os 3 graus numa altura em que desata a chover e a nevar, é desesperante.
Mas a Natureza é madrasta e mãe... e lá veio alguém dizer que as fases de queda se alternavam com períodos de estagnação; o que era preciso era contabilizar o tempo de derrocada e o tempo de acalmia, como as séries de 7 ondas com que o mar nos brinda e que permitiram ao protagonista de Pappillon fugir da ilha em que estava encarcerado... E lá fomos nós de mochilas e malas e máquinas fotográficas, uns mais apreensivos que outros.
Já vivi tufões grau 10, que fizeram cair quadros das paredes em minha casa, já vi as marés vivas arrancarem pedras dos muros da Marginal; no dia anterior tínhamos ouvido avalanches de neve; mas o que se nos deparou era, de facto, impressionante e atemorizador: tudo calmo pela encosta abaixo... de repente começava como que um rio de pequeníssimos seixos a deslizar e quando dávamos por nós estávamos entre o incrédulo, o fascinado e o assustado a ver pedregulhos enormes a tombarem e a desfazerem-se ao bater na estrada, quais bombas a largarem estilhaços em todas as direcções, antes de seguirem o seu caminho pela encosta seguinte também a pique.
E no meio de tudo alguns "loucos" que se aventuravam entre as pedras que continuavam a cair e os que ao volante de camionetas resolviam carregar no acelarador e passar também, motivando novas derrocadas consequência da trepidação provocada.
Por fim lá decidimos, um a um, testar a sorte, sempre atentos não fosse algum calhau perdido apanhar-nos pelo caminho... e assim todos passámos, pé aqui pé acolá, a tentar não torcer os tornozelos e a não cair por cima de um monte de pedregulhos de tamanhos desiguais.
O alívio foi enorme ao juntarmo-nos todos do outro lado onde já estava uma carrinha à nossa espera. E foi, entre gargalhadas catárticas, o recordar o que, a quente, alguns tinham dito: "Eu não posso passar com o meu marido" (porque têm 3 filhos), ou "Tenho que passar com a minha mulher porque não consigo ficar a olhar para ela" (ela ficou de lágrimas nos olhos), ou "Não vim para esta viagem para pôr a minha vida em perigo", ou "Não sei que vos diga... devo ser inconsciente porque não consigo ter medo duma coisa destas..."... "É, és completa e totalmente insconsciente!".
Enfim foi um momento emocionante (mas não excessivamente dramático) que a juntar à viagem do dia seguinte, por alvas estradas cortadas devido ao nevão que caíu incessantemente durante horas, a sítios e paisagens deslumbrantes e gentes encantadoras tornaram este passeio por terras do Império do Meio inesquecível.
Mas o grande, grande "amor da minha vida" foi o Tibet...

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